Não podemos esperar que uma “organização perfeita” caia em nosso colo e nos facilite a vida! Ou então, que o deus do RH, com sua espada justiceira corte as cabeças dos líderes que não entendem nada de gestão de pessoas. Necessitamos tomar nossas vidas profissionais em nossas mãos, fazendo o possível para estarmos nas organizações que fizermos por merecer.
Espero que tenha lido os dois posts anteriores:
Cada Organização tem o RH que merece – Parte 1
Cada Organização tem o RH que merece – Parte 2
Além de divertidos e incomuns, geraram uma interessante polêmica em alguns grupos de discussão. Mas agora é a vez de olhar a questão pelo outro lado…
Para ilustrar este outro lado, conto a vocês um caso recente. Outro dia, uma amiga muito querida, Gerente de RH, tomava café comigo e me comentava que, finalmente, havia tido uma iluminação: todas as dificuldades, os sofrimentos e frustrações pelos quais passava no seu cargo tinham como única causa e raiz nada mais nada menos que o senhor Presidente, que era um inútil. “Nada de apoio, nenhum posicionamento firme, zero reforço de comportamento, uma negação em assumir a gestão de pessoas como tema chave! Você não sabe como me senti melhor depois disso. Eu sempre me culpando, me considerando incompetente! ”
Depois de alguns segundos em que avaliávamos aquele exultante depoimento, o silêncio se desfez “Bom, e agora? ”, perguntei, quase instintivamente. O sorriso se apagou rapidamente dos lábios dela, ao mesmo tempo que respondia “Agora? Sei lá!”, e mexia, desanimada, o açúcar no fundo da xícara.
Muito bem. Ter o gostinho de jogar nas costas de CEOs e Líderes organizacionais, de que eles têm o RH que merecem – na maior parte dos casos, com um tom de reprovação, do tipo: “bem feito, vocês merecem ter essa porcaria de RH!”… Isso é muito reconfortante. Anos de terapia poupados, um peso a menos nos ombros dos profissionais de RH e tudo o mais.
No entanto… acontece que isso não resolve! Não resolve nosso caso, porque sabemos, lá no fundinho da alma, que arrumar culpados, não traz para nós o que desejamos para nossas vidas profissionais. Sabemos de que é preciso dar um passinho a mais…
Lembra-se daquelas nossas constantes pregações aos colaboradores (como implico com essa palavra!… mas isso é coisa para outro post) de que eles devem tomar as carreiras em suas próprias mãos e não esperar que uma força benévola, uma mão invisível, enfim, a providência empresarial, os leve ao cargo prometido? A mesma coisa se aplica a nós. Não podemos esperar que uma “organização perfeita” caia em nosso colo e nos facilite a vida! Ou então, que o deus do RH, com sua espada justiceira corte as cabeças dos líderes que não entendem nada de gestão de pessoas e, além de servi-las num prato para nosso íntimo regozijo, coloque outras iluminadas no lugar. Necessitamos tomar nossas vidas profissionais em nossas mãos, fazendo o possível para estarmos nas organizações que fizermos por merecer.
Antes de entrar com brilhantes ideias sobre o tema, queria compartilhar com vocês um problema. Eu, simplesmente, não conseguirei escrever algo do tipo “os 3 passos para ser bem sucedido em RH” ou “a receita de uma carreira estelar”. Até tentei, mas tive de recomeçar diversas vezes até me dar conta de que não, não daria conta. E, basicamente, porque eu não me considero nem um exemplo de sucesso, nem um pesquisador na área.
Começar uma frase com algo do tipo “para sermos bem sucedidos, precisamos fazer tal coisa” implica numa certeza obtida, seja por uma prova contundente, seja por estudos bem embasados. No meu caso, não tenho pesquisas. Também posso dizer que nem sempre tive uma carreira super ascendente; que já me demitiram mais vezes do que gostaria; e estive longe de ser unanimidade nas organizações pelas quais passei nesses quase 30 anos.
O que posso assegurar, no entanto, é que sempre refleti muito sobre o que me aconteceu e, geralmente, busquei olhar as coisas com o máximo de isenção que conseguia.
Por isso, considere estas linhas muito mais como uma contribuição para a reflexão que um guia para o êxito.
Voltando ao raciocínio, minha experiência me fez pensar que, para que um líder de RH possa ter a organização que merece (no bom sentido), ele necessitaria de algumas qualidades: para começar, iniciativa; para terminar, coragem.
Iniciativa
Onde mais me frustrei em minha vida foi nas organizações onde nada pude deixar como legado. E, para ser mais específico, naquelas em que me senti mais limitado… por minhas próprias barreiras psicológicas. Em bom português, onde tive medo de tentar, não por falta de espaço, mas por falta de convicção. Essa síndrome da terceirização se manifesta, normalmente, no excesso de reclamações sobre as decisões “deles”, da falta de recursos, etc. Foi olhando para a frequência com que agia dessa forma que me dei conta que a questão estava mais em mim do que “neles”.
Por outro lado, onde me senti mais satisfeito foi em organizações onde, mesmo com limitações de todo jeito, resolvi fazer “alguma coisa”. Com algum instinto de engenheiro civil, onde não conseguia construir toda a casa da gestão de pessoas, tentei montar os cômodos, imaginando que eles se encaixariam com outros quando tivesse as condições. Por exemplo, quando não me deixaram implementar a Avaliação 360º, lancei a ideia de trabalhar competências, como preparação. E, sem me dar conta, isso abriu as portas para o próximo passo… Foi daí que saí com a ideia de que, em alguns casos, é melhor morrer lutando do que simplesmente definhando.
Coragem
Isso nos leva à segunda qualidade: coragem. Quando tive meus rudimentos de filosofia aprendi que a coragem é o ponto médio (lembra-se do in medio virtus ou a virtude está no meio?) entre a temeridade (diríamos a imprudência) e a covardia.
Infelizmente, uma coisa é captar intelectualmente algo e outra, praticar. O fato é que eu sempre fui muito voluntarioso e, por vezes, tive abordagens kamikazes para alguns temas nas organizações. A duras penas, aprendi que não existe herói morto e que coragem não significa assumir riscos desnecessários e colocar família, aposentadoria e imagem profissional em perigo (imprudência!).
Por isso, quando digo que “é melhor morrer lutando do que simplesmente definhando”, quero dizer, que é preferível tentar do que simplesmente desistir – sem heróis mortos. Mas esse tentar é mais do que unicamente ter iniciativas, é também ter a disposição de questionar o status quo, mudar paradigmas, alterar a nossa situação para buscar nossos objetivos e nossa realização.
Fiquei muito impressionado pela coragem de uma jovem colega que participava comigo de um programa de formação em Coaching. Ela trabalhava como Atuária e ganhava o suficiente para não depender da família. Descobriu sua vocação de apoiar o desenvolvimento das pessoas, formou-se, treinou-se, largou o emprego e abriu sua consultoria. Uma ação corajosa, por deixar a famosa zona de conforto e privilegiar aquilo que lhe realizaria.
Mudar o quadro de nossa vida pode implicar em falar abertamente ao nosso chefe – com jeito – que a ideia dele não vai funcionar. Ou em apresentar uma proposta arrojada à liderança, que teste realmente até onde pode ir a organização nos temas que nos preocupam. Pode ser também começar a acionar nosso network – confidencialmente – antes de que as coisas se compliquem no trabalho. Ou, simplesmente, pegar o boné e buscar algo que não nos faça engordar tanto, estressar tanto, morrer aos pouquinhos… Tudo com a inteligência necessária.
Minha experiência me diz que somos mais felizes quando realmente tomamos nossas vidas em nossas mãos. E que somos mais felizes em RH, quando assumimos uma postura de protagonistas dentro das organizações.
Essas são minhas impressões sobre o tema – pelo menos até agora. Ficaria feliz de ouvir suas ideias e experiências para que possamos evoluir juntos.
Brilhante texto. A vida é isso mesmo. Ter iniciativa, coragem, prudência e buscar o que te faz querer ser melhor. Muitas vezes acreditamos que não conseguimos nada mas com o passar dos anos e uma visão não tão focada em erros e sentimentos vimos que construímos pilares importantes pra muita gente.